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Médica se divide entre plantões de 36 horas e cuidado com a filha de seis meses: ‘Amamento de

São 36 horas de plantão na emergência de um hospital, interrompidas por não mais do que duas ou três horas de sono. Os até 20 pacientes que chegam com sintomas de Covid-19 obrigam a equipe de saúde a trocar a paramentação de proteção contra o vírus o mesmo número de vezes.

São cada vez mais doentes e menos médicos, afastados com sintomas – “A gente acaba tendo que fazer a função de mais de um”. A rotina é cansativa, mas o trabalho em meio à pandemia conforta a emergencista Renata Lopes, da Clínica São Vicente de Paulo, na Zona Sul do Rio.

“A gente está lá, obviamente, de coração aberto, atendendo as pessoas porque sabe que é a nossa função mesmo. Às vezes escuto as pessoas falando: ‘ah, queria estar em casa, descansando’. Eu não. Eu queria estar onde eu estou mesmo. É um sentimento geral: está todo mundo feliz por participar disso [da ajuda aos pacientes], mas cansado”, relata.

Mãe da pequena Marina, de seis meses, ela redobra os cuidados ao chegar em casa. As orientações que Renata dá aos pacientes são as mesmas que segue em seu dia a dia: sair de casa só quando necessário e higienizar as mãos – que de tanta água, sabão e álcool gel já estão, literalmente, calejadas.

“Não tenho a opção de me isolar em algum lugar porque amamento, ainda. Então, fico de máscara o tempo inteiro em casa. Na verdade, fico o mais distante dela que eu consigo. Amamento de máscara. Já estou com dermatite de tanto lavar a mão”, conta.

Mãe e médica, Renata se desdobra no trabalho e em casa: ‘Não tenho a opção de me isolar em algum lugar porque amamento ainda’ — Foto: Arquivo pessoal

Medo da falta de leitos

Com o hospital privado onde trabalha cada vez mais cheio, ela acompanha preocupada o prognóstico de que o pico da doença venha nos próximos meses. E teme pela rede de saúde.

O Ministério da Saúde estima aumento significativo de casos a partir deste mês, indo até julho. Um estudo da Universidade Harvard aponta para a possibilidade do fim de leitos públicos no Rio até o fim de abril.

“O risco de colapso é no sistema de saúde como um todo. Independente se você paga um plano de saúde caro ou se depende do SUS (Sistema Único de Saúde). O colapso é real e iminente. Se a gente não tomar cuidado, não respeitar as orientações do Ministério da Saúde, a gente corre esse risco, sim. Vai acabar todo mundo no mesmo barco, caçando leito de CTI por aí”, alerta.

Ginecologista e obstetra por formação, Renata atende também na Maternidade Fernando Magalhães, da rede pública municipal. Lá, a escassa quantidade de testes contra o coronavírus, que acomete igualmente a rede privada, é mais perversa.

Isso porque, no atendimento ao sistema público de saúde, a dificuldade para que todos obedeçam as medidas restritivas fica muito evidente. Foi o que ela percebeu ao recomendar que uma paciente com a suspeita da doença se isolasse em casa.

“Ah, doutora. Eu moro numa casa de quatro cômodos com sete pessoas'”, relembra a médica.

Foi na maternidade onde trabalha Renata que uma gestante deu entrada com coronavírus e passou por uma cesariana. O bebê passa bem. A mãe, de 28 anos, teve complicações e foi transferida para o Hospital Ronaldo Gazzolla, onde morreu.

Se o trabalho é duro, fora dele o choque de realidade pode ser igualmente preocupante. Ao chegar ou sair da unidade, num bairro humilde da capital, a médica se impressiona com a movimentação nas ruas, “como se nada tivesse acontecido”, nas palavras dela.

“As pessoas se aglomeram na porta do hospital, sem máscara. Os bares ao redor da maternidade, em São Cristóvão, estão cheios. As pessoas estão na mesa, batendo papo. Como se nada tivesse acontecido. Acho que essas pessoas têm, realmente, uma ideia do que está acontecendo bem diferente da realidade”.

Fonte: Bem Estar

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