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“O impossível não é impossível”: a produção de vacinas Covid-19 em tempo recorde


 
 

Antes da pandemia, os amigos e a família da norte-americana Anne Leonard tinham apenas um interesse superficial em suas duas décadas de trabalho na fabricação de produtos farmacêuticos.


Mas, recentemente, quando sua avó soube que o trabalho dela como diretora de garantia de qualidade nas instalações da Catalent, no estado de Indiana, EUA, significava que a neta estava ajudando a manter as vacinas Johnson & Johnson e Moderna seguras, ela ficou tão orgulhosa que saiu contando para todos os seus amigos.


“Ela não tinha notado mesmo que eu estava tão próxima da fabricante da vacina para a Covid-19”, disse Leonard. “Ela ficou encantada”.


Leonard disse que até seus filhos de 9 e 11 anos sabem que, embora tenha de trabalhar por muitas horas mais, o que está fazendo é um trabalho importante.


“Digo que estou fazendo isso por eles, pela vovó e por seus professores”, contou Leonard.


Com a autorização da FDA, a agência reguladora de medicamentos e alimentos nos EUA, na semana passada, a Johnson & Johnson disse que cerca de quatro milhões de doses de sua vacina contra o coronavírus iriam imediatamente para os estados para ajudar a atender à enorme demanda. A empresa disse que espera fazer doses suficientes para vacinar 20 milhões de pessoas até o final de março, e tem o objetivo de produzir um bilhão de doses globalmente até o final do ano.


Mas, como disse o presidente Joe Biden na terça-feira (2), “simplesmente não estava acontecendo de forma rápida o suficiente”.


Biden anunciou que a farmacêutica Merck ajudará a fabricar a vacina Johnson & Johnson, uma decisão tomada depois que ficou claro que a J&J ficaria aquém de seus objetivos de fabricação. A parceria foi revelada pela primeira vez pelo jornal “The Washington Post”.


A Casa Branca disse que estava utilizando a Lei de Produção de Defesa para ajudar a equipar duas instalações da Merck para fabricar o produto Johnson & Johnson, inclusive reforçando a capacidade de preenchimento dos frascos e empacotamento final (conhecida pelo termo em inglês “fill/finish”) e aumentando a disponibilidade dos componentes das vacinas.


Ainda pode haver atrasos, mas Biden disse na terça-feira que os Estados Unidos terão doses suficientes da vacina contra a Covid-19 para cada norte-americano adulto até o final de maio.


Não é na base do grito

Antes que a vacina da J&J chegue ao braço de alguém, ela deve passar por um processo sofisticado e complicado que envolve várias empresas. O processo não acontece da noite para o dia, mas as empresas dizem que a fabricação de vacinas avançou a uma velocidade nunca vista antes na história da fabricação de produtos farmacêuticos.


A J&J disse que tem trabalhado com “urgência” para aumentar a produção do imunizante, mas não é fácil.


“A produção de nossa vacina é um processo altamente complexo que requer capacidades e experiências muito particulares”, disse o doutor Richard Nettles, vice-presidente de assuntos médicos da J&J ao subcomitê de Supervisão e Investigações para o Comitê de Energia e Comércio da Câmara dos EUA na semana passada.


Demora cerca de cinco ou seis semanas para fazer a engenharia genética. Depois, é preciso que a vacina cresça, seja purificada e finalizada antes de poder ser embalada, lacrada e enviada para distribuição aos centros de vacinação.


Colocando de outra forma, o doutor Paul Stoffels, diretor científico da Johnson & Johnson, disse à CNN, “não dá para acelerar na base do grito”.


A J&J examinou 100 locais de produção em potencial e encontrou oito que atendem às suas necessidades até agora, disse Nettles. Três produziram lotes de teste da vacina. A expectativa é ter capacidade adicional até o segundo trimestre do ano, com produção nos Estados Unidos, Europa, Ásia e África.


Anne Leonard trabalha na movimentada fábrica da Catalent em Bloomington, Indiana, que fica em um prédio escondido entre uma quadra esportiva e um distribuidor da Budweiser. Cinco turnos de dois mil funcionários mantêm as movimentadas linhas de produção funcionando 24 horas por dia, sete dias por semana.


A produção da vacina J&J no local começou no final de janeiro e deve chegar às mãos da autoridade reguladora em breve. As doses que vão sair esta semana vêm de outra fábrica.

A Catalent espera atender à crescente demanda por vacinas para ajudar a acabar com a pandemia.


“Estamos indo o mais rápido que podemos. Em um setor tão regulamentado, há certas etapas que não podem mesmo ser aceleradas, mas acho que estamos fazendo coisas incríveis para lançar a vacina de forma tão rápida. Todos no local sentem uma grande responsabilidade e trabalhamos dia e noite para fazer isso”.


A fábrica que, décadas atrás, fazia televisores, agora está ajudando a produzir a substância com a qual o país conta para acabar com seu isolamento.


Como a vacina é feita


A empresa que de fato inicia o processo de fabricação da J&J não é a Catalent, mas a Emergent Biosolutions, sediada em Baltimore.


A Emergent faz o trabalho de engenharia genética com um vírus conhecido como adenovírus 26, que causa o resfriado comum em humanos. Os genes são removidos do vírus para que ele não se replique e se espalhe pelo corpo. O material genético também é removido para dar lugar às instruções genéticas para fazer um pedaço da proteína spike do coronavírus, usada para se ligar às células.


O vetor de adenovírus é cultivado em cubas de células humanas em grandes reatores. O vírus resultante é purificado para remover detritos. É um processo biológico que leva várias semanas antes que o produto resultante possa ser congelado e enviado a centenas de quilômetros para empresas como a Catalent.


Tanto para a vacina da J&J quanto para a da Moderna, a Catalent é uma das empresas que faz o que é conhecido na indústria como a parte “fill/finish” do processo de fabricação.

A Catalent fará parte do esforço para aumentar a produção da J&J e vai cuidar da última etapa da fabricação antes de ir para um distribuidor e de lá para um local de vacinação para sua aplicação.


“Nós pegamos a substância do medicamento a granel, formulamos em sua forma final, enviamos de forma estéril para frascos, fazendo 100% de inspeção visual, depois embalamos e, em seguida, conduzimos o teste de controle de qualidade final”, disse Mike Riley, presidente da região, produtos biológicos, América do Norte, da Catalent. “Os produtos precisam ser completamente estéreis para que todo o processo seja altamente controlado e validado”.


A fabricação de uma vacina precisa ser limpa e administrada com cuidado. Os trabalhadores vestem roupas esterilizadas antes de entrarem em uma sala higienizada. Depois, usam luvas para manipular o equipamento isolador, de onde o produto da vacina esterilizada sai para os recipientes de vidro.


As vacinas são inspecionadas e, em seguida, voam por linhas de produção de alta velocidade – são esteiras que passam por etiquetadoras e embaladores, resultando em caixas seguras para o despacho.


Cada etapa é cuidadosamente regulada e deve ser mantida sob um olhar atento para que nada mais possa ser introduzido nos frascos de vidro além da própria vacina.


“É um processo complexo”, conta a diretora de garantia Leonard.


Aumento da produção

Durante a pandemia, a Catalent, com fábricas em todo o mundo, trabalhou com mais de 80 compostos relacionados à Covid-19 de 60 empresas diferentes para fazer antivirais, outros tratamentos e vacinas. Fez tudo isso enquanto continuava a produzir centenas de outros medicamentos essenciais para tratar de tudo, de câncer a doenças cardíacas.


Conhecendo a demanda, está aumentando continuamente o ritmo de sua produção. A empresa acelerou a expansão das instalações de Indiana em cerca de dez meses para que pudesse ter a capacidade de produzir vacinas na escala necessária.


“Atividades que às vezes acontecem ao longo de dois ou três anos foram feitas em meses”, disse Riley, da Catalent. “Conhecemos todos os parceiros de construção e os terceiros. Tivemos um foco único em como podemos fazer isso e sair da pandemia”.


A Catalent também contratou uma “quantidade significativa de funcionários” no ano passado, disse Riley, para acompanhar o ritmo. Anne Leonard foi um dessas novas aquisições, em agosto. Ela nunca tinha posto os pés na fábrica antes de aceitar o emprego e sua contratação foi feita pelo Zoom.


“Eu entrei bem no momento mais movimentado aqui de todos os tempos. Tem sido um grande desafio, mas também é muito emocionante”.


Riley disse que a Catalent tem trabalhado e planejado com empresas de vacinas sobre como fariam essas vacinas por quase um ano, muito antes de os cientistas descobrirem como seria uma vacina bem-sucedida e obter autorização da FDA.


“Quando começamos a trabalhar com Johnson & Johnson, a Moderna e outros, já prevíamos ter que aumentar substancialmente nossa produção”, contou Riley. “Para isso, adicionamos muito mais gente ao longo do ano passado apenas para garantir que possamos operar 24 horas, em sete dias de produção, uma vez que a vacina fosse aprovada”.


O presidente regional disse que os funcionários da Catalent têm feito “coisas extraordinárias durante uma pandemia global”.


“Vou citar nosso diretor de operações, que disse que ‘o impossível não é impossível, apenas ainda não foi feito’”. "Não há outra escolha. Como indústria, como país, temos que encontrar uma saída para esta pandemia”.


Kevin Liptak, Jeff Zeleny e John Harwood da CNN contribuíram para esta reportagem.


Fonte: CNN

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