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Marca de vacina no braço indica proteção contra varíola dos macacos? Veja o que se sabe



Quem está protegido contra os casos da varíola dos macacos (monkeypox, em inglês)? Há necessidade de vacinação como já anunciam alguns países pelo mundo? No Brasil não existe previsão de nova campanha, mas e quem já tomou a vacina contra a varíola tradicional no passado? Consegue identificar pela cicatriz no braço que foi imunizado?


Para responder as questões sobre o tema o g1 conversou com especialistas e reuniu informações da OMS e de agências de saúde. 1. Quando a vacina contra a varíola humana (smallpox) foi oferecida? Quem não conhece a história ou já ouviu falar algo a respeito da Revolta da Vacina, a série de rebeliões populares que uma parte da população do Rio de Janeiro desencadeou no final de 1904? Na época, o Rio vivia um aumento expressivo no número de internações ocasionadas pela varíola humana (que não deve ser confundida com a varíola dos macacos), mesmo assim, uma parte da população era contra a ideia de se imunizar com aquela que foi a primeira vacina bem-sucedida a ser desenvolvida na história da saúde pública. A alegação à época pode soar parecida se transportada para os dias de hoje: boatos e informações falsas faziam a população acreditar que a campanha de imunização obrigatória, liderada pelo médico Oswaldo Cruz, iria provocar feições bovinas e outras deformidades do tipo porque o líquido da vacina era produzido a partir de vacas doentes.

Foi somente anos depois, em 1908, quando uma nova epidemia aumentou expressivamente o número de casos que a população correu voluntariamente para se imunizar.

E décadas mais tarde, depois de muitos avanços científicos, em 1971, com uma vacina mais moderna e graças a uma intensa campanha de imunização global encabeçada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a varíola humana - que chegava a apresentar um índice de 30% e mortalidade - foi declarada erradica no Brasil.

"Erradicar é diferente de controlar. Erradicar é tirar o germe do meio ambiente completamente. E isso só foi alcançado até hoje com a varíola", explica Tania Maria Fernandes, Casa de Oswaldo Cruz/Fundação Oswaldo Cruz.

No mundo todo, os últimos casos da doença foram registrados em 1979 e a varíola foi erradicada. No ano seguinte, a Assembleia Mundial da OMS recomendou que todos os países cessassem suas campanhas de vacinação. Estudos apontam que a vacinação contra a varíola humana (smallpox) é cerca de 85% eficaz na prevenção da varíola dos macacos. Mas como essa varíola foi erradicada há mais de 40 anos, atualmente não temos vacinas disponíveis para o público em geral (somente um seleto grupo de pessoas, como alguns profissionais de saúde, receberam o imunizante nos últimos anos). 2. Como saber quem foi imunizado no Brasil em campanhas no passado? A famosa marca da vacina BCG, um dos primeiros imunizantes aplicados em bebês e que protege contra a tuberculose, é resultado de uma reação imunológica à vacina.

E a vacina contra a varíola também causa uma reação semelhante. Mas dá para saber qual foi o imunizante aplicado só ao olhar para a marquinha no nosso braço?

John Ross, professor assistente de medicina em Harvard e especialista em doenças infecciosas, levantou essa dúvida em uma rede social. A postagem em que o médico afirmava que sim, era possível diferenciar a marca, teve repercussão no Twitter, mas logo ele se retratou e retirou do ar a informação. Em entrevista ao g1, o especialista explicou que em geral, as cicatrizes de BCG são menores e menos propensas a terem um sulco do que as cicatrizes de varíola, mas que, mesmo para um profissional de saúde, pode ser impossível identificar a marca, tendo em vista que algumas pessoas têm reações “impressionantes”. “A coisa mais útil é a idade de uma pessoa. [Nos Estados Unidos e no Canadá] as pessoas nascidas na década de 1960 e antes disso certamente tomaram a vacina contra a varíola”, diz. No Brasil, Fernandes explica que é “impossível” saber ao certo quem foi o público vacinado, mas ressalta que, depois de 1971, ninguém mais foi imunizado contra varíola no país.

Além disso, a pesquisadora da Fiocruz pontua que, como em todas campanhas de vacinação, atingir a marca de 100% da população vacinada é algo muito difícil de acontecer. “Isso não temos dúvida. Nunca se alcança isso. Dependendo da doença, algo em torno de 70%, 80% já caminha para um controle de doença”, diz.

Outro fator importante é que, como a campanha terminou há muito tempo, muitas pessoas não têm guardado seu comprovante de vacinação. Na época, não existia nem mesmo uma carteirinha como a dos moldes de hoje. “Eu mesma não tenho notícias da minha carteira, até já achei, mas era um papel separado”, relembra a especialista.

O g1 entrou em contato com o Ministério da Saúde para saber quantas pessoas foram vacinadas contra a varíola no país até o fim da campanha de erradicação da doença, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem. 3. Quais são as vacinas que temos hoje contra a varíola? Elas são eficazes contra a varíola dos macacos? As duas vacinas atuais são a ACAM2000, da Sanofi Pasteur, e a JYNNEOS (também conhecida como Imvamune ou Imvanex), da Bavarian Nordic. Nenhuma delas está amplamente disponível. Depois dos atentados de 11 de setembro, temendo uma ameaça biológica de terrorismo, os Estados Unidos chegaram a lançar uma campanha de imunização de militares e trabalhadores de saúde com a ACAM200 (na época chamada de Dryvax), mas que foi logo encerrada devido a crescentes ceticismos sobre os riscos de tal ataque e a eficácia do programa.

Hoje, tanto a Agência de Segurança da Saúde do Reino Unido (UKHSA, na sigla em inglês) como os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) ressaltam que os dois imunizantes podem ser usados para controlar o surto de varíola dos macacos.

A ACAM2000 é administrada em dose única por via percutânea. Nos Estados Unidos, ela pode ser usada na imunização de pessoas com pelo menos 18 anos de idade e com alto risco de infecção por varíola. Já a JYNNEOS, uma vacina de vírus vivo atenuado, está licenciada para uso nos EUA para prevenir a varíola dos macacos e a varíola humana. É esse imunizante que, em estudos clínicos, mostrou ser 85% eficaz na prevenção da varíola dos macacos. Além disso, segundo o CDC, a imunização com a vacina da farmacêutica dinamarquesa após uma exposição à varíola dos macacos pode ajudar a prevenir a doença ou torná-la menos grave. 4. Quem deve ser vacinado no atual momento em países que anunciaram que investirão na estratégia? A Organização Mundial da Saúde (OMS) avalia que o atual surto pode ser controlado por meio de vacinas e outros procedimentos que já estão disponíveis. Além disso, segundo disse à agência Reuters Richard Pebody, especialista em patógenos de alta ameaça da OMS na Europa, a organização não acredita que o surto fora da África exija vacinações em massa, pois medidas como boa higiene e comportamento sexual seguro ajudarão a controlar sua propagação.

No Reino Unido, embora a agência de saúde britânica ressalte que sua prioridade é garantir o uso adequado de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), a UKHSA emitiu uma recomendação para que profissionais de saúde que tiveram contato com infectados possam ser vacinados com o imunizante da Bavarian Nordic.

Da mesma forma, o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC) ressaltou que a vacinação de contatos próximos de alto risco deve ser considerada. "No entanto, uma avaliação cuidadosa do benefício/risco deve ser realizada para o indivíduo exposto", evidencia o órgão europeu. Já o CDC ainda não estabeleceu as diretrizes de vacinação contra a doença nos EUA. Para Eliseu Alves Waldman, professor de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP, a vacinação deve ser indicada justamente quando há contato com casos confirmados, para bloquear surtos epidêmicos. "Campanha de vacinação em massa, é pouco provável, a não ser em situações de emergência sanitária, situação pouco provável na vigência de epidemia por monkeypox [varíola dos macacos]".

A epidemiologista Ethel Maciel concorda com o colega e acrescenta que essas estratégias são importantes pois esses são os grupos mais expostos à doença. Ela destaca que, como ainda não sabemos como esse vírus vai se comportar (embora dados inicias sugiram que ele seja menos transmissível), é fundamental que adotemos tal procedimento aqui no Brasil.

"A gente precisa se preparar para a resposta e eu acredito que precisamos da vacina para caso tenhamos casos aqui, tenhamos para os grupos mais expostos", diz.

No último boletim sobre a varíola dos macacos da rede CIEVS (Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde), entidade que é vinculada ao Ministério da Saúde, foi destacado o fato de que a vacinação universal não é recomendada, porém nem a rede nem a pasta emitiram recomendações sobre a vacinação de pessoas de alto risco. Sobre a questão, o g1 também questionou o Ministério da Saúde e aguarda resposta.

"Ainda, não sabemos, mas é sempre importante estarmos preparados (do ponto de vista da saúde pública) para um pior cenário, se ele não ocorrer, pelo menos as vidas serão poupadas e as vacinas sempre podem ser utilizadas para pessoas civis e militares que forem para regiões de risco no continente africano. Ou seja, é um investimento", conclui a pesquisadora.


Fonte: G1

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