Fazer atividade física a partir dos 45 anos reduz o risco de demência (até para quem tem predisposição genética), diz novo estudo
- Portal Saúde Agora
- há 2 horas
- 5 min de leitura

Mexer-se faz bem para o corpo... e para o cérebro. Um estudo americano de grande escala mostra que a atividade física regular, mesmo iniciada após os 45 anos, pode reduzir significativamente o risco de demência, inclusive em pessoas com predisposição genética. Isso comprova ainda mais que o exercício continua sendo uma das melhores maneiras de manter a mente ativa à medida que envelhecemos.
Há anos, os cientistas sabem que movimentar o corpo pode aguçar a mente. De fato, a atividade física estimula o fluxo sanguíneo para o cérebro, melhora a neuroplasticidade e reduz a inflamação crônica. Esses processos são considerados protetores contra o declínio cognitivo, incluindo o risco de demência.
Apesar de décadas de pesquisa, questões importantes permanecem sem resposta. A atividade física reduz o risco de demência em qualquer idade? Ou apenas quando se é jovem? E se a pessoa tiver um risco genético maior, o exercício físico ainda pode fazer diferença?
Um novo estudo, recém-publicado na revista médica JAMA Network Open, fornece algumas das respostas mais claras disponíveis até o momento. Baseado em dados do estudo epidemiológico de longo prazo Framingham Heart Study, realizado nos Estados Unidos, suas conclusões confirmam o que muitos médicos já diziam aos seus pacientes: o exercício físico é benéfico.
Esta pesquisa também lança nova luz sobre o potencial efeito protetor da atividade física regular a partir dos 45 anos, mesmo em pessoas com certa predisposição genética à demência. A análise segue abaixo.
Em que consistiu este estudo?
Esta nova pesquisa baseia-se em dados de 4.290 participantes da coorte de descendentes do Estudo do Coração de Framingham. Iniciado em 1948, este estudo teve como objetivo investigar os fatores de risco cardiovascular a longo prazo. Em sua concepção, os pesquisadores recrutaram mais de 5.000 adultos com mais de 30 anos residentes em Framingham, Massachusetts, EUA.
Em 1971, uma segunda geração de participantes (mais de 5.000 filhos da coorte inicial — agora adultos — e seus cônjuges) foi recrutada para formar a coorte "Descendentes". A saúde dessa geração foi monitorada por meio de exames médicos regulares realizados de cada quatro a oito anos.
Como parte do trabalho publicado no JAMA Network Open, os participantes relataram sua própria atividade física. Isso envolveu o registro tanto de atividades diárias básicas, como subir escadas, quanto de exercícios físicos mais intensos.
Os voluntários responderam ao questionário pela primeira vez em 1971, e o processo foi repetido por várias décadas subsequentes. Dependendo da idade na época da avaliação inicial, os participantes foram divididos em três categorias:
Adultos jovens (26-44 anos): avaliados no final da década de 1970;
Pessoas de meia-idade (45-64 anos): avaliadas no final da década de 1980 e na década de 1990;
Idosos (65 anos ou mais): avaliados no final da década de 1990 e início da década de 2000.
Para avaliar a influência da atividade física no risco de demência, os pesquisadores observaram, em cada faixa etária, o número de pessoas que desenvolveram demência e em que idade o diagnóstico foi feito.
Em seguida, compararam os padrões de atividade física (baixa, moderada, alta) em cada faixa etária, a fim de determinar se era possível estabelecer uma ligação entre a quantidade de exercício e o início da demência.
Os autores do estudo também identificaram indivíduos com o alelo APOE ε4, que é conhecido por ser um fator de risco genético para a doença de Alzheimer.
O que os cientistas descobriram?
Durante o período de acompanhamento, 13,2% (567) dos 4.290 participantes desenvolveram demência. Os indivíduos afetados pertenciam principalmente ao grupo de voluntários mais idosos.
Essa taxa é relativamente alta em comparação com outros estudos longitudinais (ou seja, de longo prazo) sobre demência ou com os níveis de risco de demência registrados na Austrália (8,3% dos australianos com mais de 65 anos têm demência atualmente, ou cerca de 1 em cada 12 ).
Ao analisar os dados, os pesquisadores descobriram uma tendência surpreendente: pessoas que relataram os níveis mais altos de atividade na meia-idade e na velhice apresentaram um risco 41% a 45% menor de desenvolver demência do que aquelas que relataram os níveis mais baixos.
Essa associação persistiu mesmo após levar em consideração outros fatores de risco, sejam eles demográficos (idade, escolaridade) ou médicos (hipertensão, diabetes).
É interessante notar que a prática de atividade física no início da idade adulta não teve influência no risco de demência.
A análise da influência do fator genético APOE ε4, um conhecido fator de risco para a doença de Alzheimer, constitui um dos principais avanços deste estudo. Ela destacou os seguintes pontos:
Na meia-idade, a prática de atividades físicas mais intensas reduziu o risco de desenvolver demência apenas em pessoas que não possuíam o alelo;
Em contrapartida, em idade avançada, a prática de atividade física mais intensa reduziu o risco tanto em portadores do alelo quanto naqueles que não o possuíam.
Em outras palavras, para pessoas geneticamente predispostas à demência, manter-se ativo em idade avançada pode continuar a oferecer proteção significativa.
Qual é a importância desses resultados?
Essas descobertas reforçam o que os cientistas já sabem: o exercício físico faz bem para o cérebro.
Este estudo se destaca não apenas pelo grande tamanho da amostra, mas também pela duração excepcional do acompanhamento e pelo fato de ter realizado uma análise genética abrangendo diferentes períodos da vida dos participantes.
O fato de ter sido revelado que a prática de atividade física na meia-idade pode ter efeitos diferentes dependendo do risco genético, enquanto manter-se ativo na terceira idade beneficia quase todos, poderia ser usado para enriquecer as mensagens de saúde pública.
Um estudo que apresenta algumas limitações
Neste estudo, o nível estimado de atividade física baseia-se em grande parte em autorrelato. Portanto, existe o risco de viés de memória (os participantes tendem a se lembrar do evento – neste caso, sua atividade física – de forma diferente de como realmente aconteceu). Além disso, não se sabe quais tipos de exercício são mais benéficos.
Como o número de casos de demência entre os participantes mais jovens foi baixo, o alcance das conclusões é mais limitado em relação ao início da idade adulta.
A coorte escolhida, composta por participantes que são maioritariamente descendentes de populações europeias e que provêm todos da mesma cidade, limita a generalização dos resultados a populações mais diversas.
Isto é particularmente importante, dado que existem desigualdades significativas em todo o mundo no risco de demência e no diagnóstico desta condição.
Que conclusões podem ser tiradas deste estudo?
Atualmente, o conhecimento sobre demência e seus fatores de risco ainda é limitado em grupos étnicos diversos. Em muitos lugares, ela ainda é frequentemente vista como um "componente normal" do envelhecimento.
A conclusão que podemos tirar deste estudo, no entanto, pode ser resumida em duas frases: movimente-se mais, independentemente da sua idade. Os benefícios que você colherá superam claramente os riscos.
Fonte: O Globo


