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Erros médicos graves aumentam após compra de hospitais por empresas de capital privado; entenda



A taxa de complicações médicas graves aumentou em hospitais após serem adquiridos por empresas de investimento em capital privado, de acordo com um estudo sobre os efeitos dessas aquisições na assistência a pacientes nos últimos anos.


O estudo, publicado na revista JAMA nesta terça-feira, descobriu que nos três anos após um fundo de capital privado comprar um hospital, eventos adversos, como infecções cirúrgicas e úlceras de pressão, aumentaram 25% entre pacientes do Medicare, em comparação a hospitais semelhantes que não foram comprados por tais investidores. Os pesquisadores relataram um aumento de quase 38% em infecções de corrente sanguínea relacionadas a cateter central (um tipo perigoso de infecção que as autoridades médicas dizem que nunca deveria ocorrer), e um aumento de 27% em quedas de pacientes durante a estadia no hospital.


— Não ficamos surpresos ao ver um sinal, mas com a intensidade — afirma Sneha Kannan, pesquisadora em saúde e médica na divisão de cuidados pulmonares e intensivos do Massachusetts General Hospital, e principal autora do artigo.


Embora os pesquisadores tenham encontrado um aumento significativo nos erros médicos, eles também observaram uma leve diminuição (quase 5%) na taxa de pacientes que morreram durante a estadia no hospital. Os pesquisadores acreditam que outras mudanças, como uma mudança para pacientes mais saudáveis admitidos nos hospitais, poderiam explicar esse declínio. Após 30 dias da alta dos pacientes, não houve diferença significativa nas taxas de mortalidade entre os hospitais.


Outros pesquisadores que revisaram o estudo disseram que, embora não fornecesse uma imagem completa dos efeitos do capital privado, a pesquisa levantava questões importantes sobre a qualidade do atendimento em hospitais adquiridos por estes proprietários.


— Isso é importante, porque é a primeira peça de dados que sugere de maneira bastante forte que há um problema de qualidade quando o capital privado assume — defende Ashish Jha, diretor da Escola de Saúde Pública da Universidade Brown, que também estudou extensivamente a segurança hospitalar.


Ao longo das últimas duas décadas, as empresas de capital privado se tornaram importantes atores na área da saúde, adquirindo não apenas hospitais, mas também um número crescente de lares de idosos, consultórios médicos e empresas de assistência domiciliar. As empresas reúnem dinheiro de investidores institucionais e indivíduos para formar fundos de investimento, muitas vezes comprando hospitais e outras entidades por meio de altos níveis de dívida, com o objetivo de revendê-los em alguns anos.


Um estudo recente sugeriu que as empresas estavam consolidando grupos de médicos em determinados mercados locais, o que poderia levar a preços mais altos. Até agora, essas empresas detêm uma pequena parcela dos hospitais nos Estados Unidos, embora os números sejam difíceis de medir, já que as transações nem sempre são públicas.


Vários relatos da mídia mostraram que alguns dos hospitais adquiridos foram obrigados a fechar por problemas financeiros, e alguns foram alvo de escrutínio regulatório por problemas de qualidade. Mas tais exemplos não são necessariamente típicos.


— A indústria de capital privado desempenha um papel essencial ao fornecer aos hospitais locais o recurso que precisam para melhorar o atendimento ao paciente, expandir o acesso e impulsionar a inovação. Essa pesquisa não reflete o histórico completo do private equity de fortalecer a saúde em todo o país — argumenta Drew Maloney, CEO do American Investment Council, um grupo comercial do setor.


A indústria tem sido recentemente alvo de escrutínio. Este mês, o Comitê de Orçamento do Senado iniciou uma investigação bipartidária sobre a propriedade de hospitais por capital privado. Projetos de lei de vários democratas no Congresso pediram mais relatórios públicos sobre negócios na área da saúde e reformas mais amplas sobre como as empresas podem obter lucros.


Vários estudos examinaram os efeitos financeiros das empresas de capital privado nos hospitais. O novo artigo, que examina 51 hospitais entre 2009 e 2019, fornece evidências inéditas de que essas mudanças podem resultar em condições mais perigosas para os pacientes. Os pesquisadores, que também incluem Zirui Song de Harvard e Joseph Dov Bruch da Universidade de Chicago, receberam financiamento da Arnold Ventures, um grupo que apoia uma ampla variedade de pesquisas em saúde e tem sido crítico da indústria de capital privado.


Estudos anteriores constataram que os pacientes tinham menos probabilidade de morrer após visitar um hospital apoiado por capital privado, mas os pesquisadores disseram que queriam focar seu estudo em medidas específicas — como erros médicos que refletissem mais diretamente o atendimento em um hospital —, em vez de mortes de pacientes, que são mais propensas a ser influenciadas pelo estado de saúde dos pacientes.


Os pesquisadores examinaram uma variedade de erros que o Medicare acompanha e incentiva os hospitais a minimizar. Unidades com altos níveis de alguns de problemas — como infecções de linha central — devem pagar penalidades financeiras ao governo. Embora nem todos os erros tenham ocorrido com frequência suficiente para serem medidos com precisão, e as complicações ocorreram raramente no geral, todas as oito medidas individuais estudadas no artigo pioraram nos hospitais comprados por fundos de capital privado.


As taxas das complicações diminuem há cerca de 15 anos, à medida que os hospitais trabalham para reduzi-las e difundir as melhores práticas para evitá-las.


— São eventos adversos evitáveis que todos acham que não deveriam acontecer em hospitais — diz David Blumenthal, ex-presidente do Commonwealth Fund, um grupo de pesquisa em saúde sem fins lucrativos, que revisou o estudo.


Alguns proprietários de capital privado podem estar excessivamente ansiosos para cortar custos, o que pode levar a uma queda na qualidade do atendimento.


— É sobre o estilo de investimento. É sobre a agressividade e os lucros de curto prazo e o retorno do investimento que são buscados — opina Blumenthal.


O ex-presidente do Commonwealth Fund acrescenta que, nos casos em que a estratégia não é seguida, o capital privado pode ser positivo, visto que "traz capital e inovação".


Os pesquisadores disseram que a explicação mais provável para o aumento dos erros foi a redução de funcionários nos hospitais, um efeito medido em outros estudos.


Mas este artigo não mediu diretamente os níveis de pessoal nos hospitais que examinou. Zirui Song defende uma supervisão mais rigorosa do governo das empresas de capital privado na área da saúde, mas estudiosos dizem que, embora o novo artigo levante preocupações sérias, ainda deixa algumas perguntas importantes sem resposta.


— Isso deve nos fazer prestar atenção ao que está acontecendo, não nos levar a introduzir mais políticas em massa — coloca Zack Cooper, professor de saúde pública e economia em Yale, que examinou a indústria.


Vivian Ho, professora de economia em Rice, foi coautora de um artigo que documentou reduções no quadro de funcionários, após as empresas comprarem hospitais e realizarem cortes na enfermagem. Ho observa que é difícil ter certeza se as reduções são resultado da mudança de liderança ou da propriedade por uma empresa de capital privado especificamente. No entanto, ela acredita que os resultados são alarmantes o suficiente para que anseie por ver mais evidências.


— Estou disposta a acreditar que é por causa dos problemas de pessoal. Você só combina isso com os relatos do que está acontecendo em alguns desses hospitais, e é uma história consistente — conclui.

Fonte: G1

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