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“É preciso parar com essas falsas propagandas de cura do autismo”



Se há um tema que, com frequência, bomba nas redes sociais é autismo. O aumento no diagnóstico da condição (tanto em crianças como em adultos), as descobertas recentes sobre a influência dos genes e do período gestacional em seu desenvolvimento e a mobilização dessa comunidade por mais conscientização e respeito são um dos principais motivos.

O outro, bem menos nobre, vem de promessas estapafúrdias para prevenir ou curar o transtorno, completamente insustentáveis.


Ainda que o autismo seja compreendido hoje dentro de um espectro dividido em níveis de funcionalidade e autonomia do paciente, há quem defenda que desvencilhar-se de rótulos e focar em uma abordagem realmente individualizada é o melhor caminho para lidar com as eventuais limitações do quadro e problemas de saúde que podem acompanhá-lo.


Essa é a visão de Barry Prizant, especialista em neurodesenvolvimento americano que lançou recentemente no Brasil o livro Humano À Sua Maneira (Edipro). Cocriador de um programa educacional para indivíduos no espectro autista e seus familiares, o professor argumenta, baseado em mais de 50 anos de trajetória na área, que é preciso derrubar mitos difundidos por aí e se sobrepor a categorizações que não levam a nada em termos de qualidade de vida.

E critica veementemente quem vende “curas para o autismo”.


Com a palavra, o autor.

Estamos vendo um aumento no diagnóstico de autismo? A que atribui esse fenômeno?


Essa é uma questão complexa. O que ainda permanece sem resposta é se há um verdadeiro aumento na incidência de autismo ou se apenas estamos reconhecendo melhor a condição mais cedo ou em pessoas mais velhas que não foram diagnosticadas antes. Estamos, de fato, atendendo mais adultos autodiagnosticados e percebendo que o autismo em mulheres muitas vezes não é diagnosticado. Mas também vejo mais diagnósticos equivocados do que nunca, quando crianças com outras condições de neurodesenvolvimento, como dificuldades de linguagem e aprendizado, distúrbios de processamento sensorial e TDAH, recebem um diagnóstico de autismo mesmo sem ter todos os critérios para o quadro. O que torna tudo mais complicado é que muitas dessas condições também podem ocorrer simultaneamente ao autismo.


Dentro do espectro do autismo, há graus de funcionalidade e comprometimento. Como isso impacta a abordagem de cada paciente?

Durante décadas, os pesquisadores tentaram desenvolver subcategorias para o transtorno do espectro do autismo, com pouco sucesso em conduzir a abordagens educacionais e terapêuticas específicas. A questão que permanece é se diferentes subcategorias levam a abordagens mais individualizadas. Até o momento, minha opinião é que as diferenças nos diagnósticos não levam necessariamente a estratégias apropriadas.


Na verdade, não há como ignorar que existem padrões de desenvolvimento únicos, com suas fortalezas e desafios, e a influência do estilo de vida da família e de outros fatores capazes de impactar a qualidade de vida daquele indivíduo. Não podemos determinar prioridades educacionais e terapêuticas apenas a partir de uma categoria diagnóstica. Em nosso programa educacional, os objetivos com os quais trabalhamos não são baseados em um rótulo, mas em uma análise cuidadosa dos pontos fortes e das necessidades de cada pessoa, em colaboração com a sua família.


É comum ver promessas de cura do autismo na internet. O que diria sobre elas?


É amplamente aceito que não há “cura” para o autismo. Isso não quer dizer que não haja um tremendo potencial para ajudar uma criança ou um adulto com autismo a ter uma vida com qualidade. Muitos autistas dizem que sua condição é parte essencial deles, incluindo de seus pontos fortes e desafios, e não gostariam de ser curados. Muitos pais dizem o mesmo, quando refletem sobre como sua vida ficou melhor de várias maneiras por ter um membro da família que é autista.


Se uma pessoa tem desafios significativos devido ao autismo ou, como ocorre frequentemente, a condições de saúde física e mental concomitantes, precisamos fornecer tratamentos para reduzir qualquer sofrimento. Agora, aqueles que comunicam por aí que podem “curar” o autismo precisam parar com essa falsa propaganda. E, se são profissionais de saúde que estão falando, isso beira a negligência, haja vista o corpo de pesquisas publicadas a respeito.

Simples e diretamente, isso precisa parar.


Fonte: Veja

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