Pesquisadores da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, junto com profissionais da Universidade de São Paulo (USP), mostraram que parte da toxina antraz atua nos neurônios que sinalizam a dor e a substância pode pode ser utilizada como analgésico. Segundo o estudo, publicado na revista científica Nature, o pedaço do antraz ajuda no transporte de outras substâncias analgésicas até as células neuronais.
Em certas condições, as bactérias Bacillus anthracis desenvolvem o antraz, que gera feridas na pele e problemas respiratórios nos indivíduos expostos. A substância pode levar à morte em poucas horas e, por isso, já foi utilizada como arma biológica, mas os cientistas analisaram os efeitos dos componentes não letais da toxina.
Em entrevista para o site da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Thiago Mattar Cunha, integrante do Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID) e coautor do estudo, comentou que a ação analgésica do antraz atua diretamente nos neurônios.
“Isso ocorre porque um dos receptores das células neuronais relacionadas à dor tem alta afinidade com essa toxina. A ideia agora é usar esse pedaço não letal e associá-lo a outras substâncias para obter um efeito específico nos neurônios”, explica o cientista.
Cunha afirma que o objetivo da pesquisa é produzir um novo tipo de medicamento através desse componente da toxina. Segundo ele, o analgésico poderia atuar de forma mais específica e ser usado para diferentes dores patológicas que não respondem a outros remédios. Os experimentos usaram camundongos para analisar as formas de dor crônica, neuropática, inflamações e outras doenças.
Composição da toxina
De acordo com os especialistas, a toxina antraz é composta por três componentes diferentes: o fator de edema, o fator letal e o antígeno protetor. A última funciona se ligando às células e injetando substâncias prejudiciais ao organismo, mas não possui efeito biológico.
Por isso, os cientistas uniram o antígeno protetor com o fator edema, que também não é letal. Eles acreditam que, provavelmente, o composto bloqueia a união dos neurônios, impedindo a transmissão da informação dolorosa até o sistema nervoso central e a sensação de dor.
“Além de descobrir que o antígeno se ligava aos receptores das células neuronais relacionadas à dor, constatamos que, quando associado ao fator de edema e injetado no cérebro dos camundongos, o composto chega ao gânglio da raiz dorsal, onde estão os neurônios relacionados à dor. E observamos que isso produzia analgesia”, conta Cunha.
Os pesquisadores também realizaram experimentos com diferentes compostos. Em um dos testes, o antígeno foi unido à toxina botulínica, e ficou claro que a substância entregava a toxina botulínica diretamente para as células neuronais relacionadas com a dor.
“Isso pode abrir um leque grande de novos analgésicos para diferentes tipos de patologia, que atuem diretamente nos neurônios sinalizadores da dor”, diz o pesquisador.
Fonte: Metrópoles