Você sonha muito acordado? Costuma ficar lento e tende a se desligar facilmente quando está fazendo uma tarefa? Você pode ter a Síndrome do Desinteresse Cognitivo, ou SDC. Em inglês é chamado de CDS (cognitive disengagement syndrome) e, no Brasil, há especialistas que preferem chamar de Síndrome do Desengajamento Cognitivo. Os significados são iguais.
A SDC foi descrita pela primeira vez por psicólogos nas décadas de 1960 e 1970. Eles notaram que algumas pessoas apresentavam essas características de forma mais persistente do que outras.
Mas por que é considerada uma síndrome e não apenas um traço de personalidade peculiar? A distinção está no efeito. Para as pessoas com SDC, o comportamento interfere significativamente na vida diária, no desempenho acadêmico e nas interações sociais.
Embora todos sonhem acordados ocasionalmente, quem experiencia essa síndrome tem dificuldade em manter a concentração em tarefas por períodos prolongados. Não se trata apenas de ser desatento e, muito menos, preguiçoso; trata-se de um padrão persistente que pode prejudicar a capacidade de alcançar sucesso em várias áreas da vida.
Ao contrário do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), que inclui hiperatividade e impulsividade, a SDC é caracterizada por um “ritmo cognitivo lento” – o nome anterior dado para a condição. Não é reconhecida como o “transtorno de atenção” descrito no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, que dita a classificação padrão usada por profissionais nos Estados Unidos.
Entretanto, o crescente número de pesquisas sugere que ela merece mais observação e deve ser analisada separadamente do TDAH. Uma maneira de separar os dois é: se uma pessoa tem TDAH, ela é capaz de se concentrar em algo, mas provavelmente se distrairá e mudará o foco para outra coisa. Quem tem SDC, não consegue se concentrar, ponto final.
Como identificamos a SDC?
O diagnóstico é complicado porque não há critérios oficiais. No entanto, alguns psicólogos usam uma combinação de questionários e observações comportamentais para avaliar sinais como sonhar acordado com frequência, ter nebulosidade mental e capacidade de processamento lenta.
Os pais e professores geralmente relatam que as crianças parecem “fora de si” ou demoram mais para responder a perguntas e concluir tarefas. Com velocidade de processamento lenta, absorver informações, entendê-las e apresentar resultado implica um consumo maior de tempo. Não se deve à falta de inteligência ou de esforço – simplesmente, o cérebro destrincha as informações em um ritmo mais devagar.
O suporte e o tratamento para a SDC ainda estão evoluindo. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é comumente usada para ajudar a desenvolver melhores formas de lidar com a situação e melhorar o foco.
Alguns pesquisadores estão explorando o uso de medicamentos estimulantes, semelhantes aos usados para TDAH, mas as evidências ainda são inconclusivas.
Mudanças no estilo de vida, como ter uma rotina de sono mais estável e incorporar exercícios regulares, também são recomendadas para ajudar a controlar os sintomas.
Falta de conscientização
Uma das maiores dificuldades é a falta de conscientização, inclusive de alguns profissionais da área de saúde. Por desconhecimento, podem descartar a SDC e impedir que pacientes busquem ajuda e recebam o apoio de que precisam.
Apesar da falta de reconhecimento oficial, estima-se que a SDC possa afetar uma parcela significativa da população. Estudos sugerem que ela pode ser tão comum quanto o TDAH, que afeta cerca de 5% a 7% das crianças. Muitos podem estar experienciando os sintomas sem nem mesmo saber disso.
Compreender a Síndrome do Desinteresse Cognitivo é fundamental pois pode evitar sofrimento e encurtar o caminho para o tratamento correto. Ao reconhecer que o comportamento diferente de determinada pessoa não é apenas uma peculiaridade – ou uma tentativa de mostrar-se descolado demais para se importar com coisas rotineiras -, mas, sim, um indicador potencial de um problema mais complexo, pode-se ajudar a controlar os sintomas e melhorar a qualidade de vida de muita gente.
Texto escrito pela professora Sofia Barbosa Boucas, da Universidade Brunel de Londres. Foi publicado originalmente no portal de divulgação científica The Conversation.
Fonte: Metrópoles
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