Casais preocupados com libidos “desiguais”. Pessoas com dificuldades para alcançar o orgasmo. Amantes se perguntando se estão tendo uma quantidade “normal” de sexo.
Terapeutas sexuais, educadores e pesquisadores costumam ver esses problemas repetidamente.
Por isso, o New York Times entrou em contato com vários deles para perguntar: "O que vocês gostariam que mais pessoas soubessem sobre sexo e intimidade?"
Aqui está o que os especialistas têm a dizer.
A comparação é o ladrão da alegria sexual
Lori Brotto, psicóloga e professora da Universidade de British Columbia, que é autora de "Better sex through mindfulness" ("Sexo melhor usando mindfulness", em tradução livre) passa muito tempo tentando convencer as pessoas a descartarem o conceito de uma vida sexual “normal” quando se trata de como e com que frequência se envolvem em atos de intimidade.
A frequência com que os casais têm relações sexuais não é uma medida significativa de saúde sexual, ela diz, mesmo que seja algo com o qual “as pessoas realmente se preocupam”. Isso não diz nada sobre se os indivíduos estão realmente aproveitando o tempo com seus parceiros e que sexo estão tendo, acrescenta.
— Já trabalhei com casais que fazem sexo todas as noites e estão infelizes juntos — ecoa Casey Tanner, terapeuta sexual baseada na cidade de Nova York e autora de "Feel it all" ("Sinta tudo", em tradução livre). Por outro lado, ela trabalhou com casais que se sentem profundamente conectados e que fazem sexo talvez três vezes por ano.
Deixe de lado o jogo dos números, recomenda Tanner, e concentre-se em como são as sensações de cada experiência sexual.
Pode ser hora de atualizar sua definição de “sexo”.
— Temos uma tendência a pensar no sexo como uma ação — explica Esther Perel, terapeuta de casais e autora. — Mas o sexo não é algo que você faz, é um lugar para onde você vai.
Ela frequentemente faz perguntas como: "O que você quer experimentar lá? Isso é uma experiência, para você, de transcendência? De união espiritual? De profunda conexão?". Ou "é uma experiência onde você pode ser travesso e, pela primeira vez, não ser um bom cidadão?"
Reconhecer que o orgasmo conjunto não é o único destino durante o sexo pode ajudar os casais a saírem do impasse, observa Perel.
Candice Nicole Hargons, professora associada na Universidade Emory e autora do livro "Good sex" ("Bom sexo", em tradução livre), incentiva seus clientes a pensarem na ideia de um “cardápio sexual”.
— A maioria de nós recebe esse cardápio sexual realmente sem tempero quando somos crianças — compara.
Os tipos de sexo em nosso cardápio podem ser influenciados pela mídia, pelas aulas de educação sexual e pelo que captamos socialmente. Mas ela incentiva seus clientes de terapia sexual a criar um cardápio mais saboroso e personalizado “para que digam por si mesmos quais são seus sins, quais são seus nãos, quais são seus talvez”.
O único ponto inegociável? O prazer deve ser o prato principal.
— Você ficaria surpreso com quantas pessoas eu converso diariamente que não entendem que o sexo não deve ser doloroso — revela Jessica Ross, terapeuta sexual baseada em Michigan. — Orgasmo? Opcional. Mas o prazer é obrigatório.
Existe mais de um tipo de desejo
O desejo sexual, como é retratado na TV, nos filmes e na pornografia, é invariavelmente espontâneo — um desejo súbito e avassalador de fazer sexo. Mas existe outro tipo de desejo igualmente válido, conhecido como desejo responsivo. Ele surge em resposta a estímulos deliberados de prazer ou erotismo, explica Lauren Fogel Mersy, psicóloga e terapeuta sexual baseada em Minnesota e autora de "Desire" ("Desejo").
Pessoas que tendem a experimentar desejo responsivo devem se sentir tranquilas de que “não há nada de errado com elas”, afirma. Elas não "estão quebradas", podem simplesmente precisar trabalhar um pouco mais para entender que tipo de estímulo erótico as ajuda a se sentirem abertas à possibilidade de intimidade, como o toque, por exemplo.
Além disso, os casais precisam abandonar a expectativa de que deveriam estar alinhados na forma e no momento em que experimentam o desejo.
— A discrepância de desejo é a norma, não a exceção — sustenta Fogel Mersy.
Nunca subestime o poder do clitóris
— O clitóris é a fonte de poder do orgasmo feminino, e a grande maioria das terminações nervosas sensíveis que contribuem para o prazer está localizada na superfície da vulva, não dentro da vagina — explica Ian Kerner, terapeuta sexual baseado na cidade de Nova York e autor de "She comes first" ("Ela vem/goza primeiro").
A maioria das posições de relação sexual não oferece muita estimulação clitoriana, esclarece, o que é um grande fator de influência na diferença de prazer entre casais heterossexuais. Quando se adota uma abordagem mais “clitoriana do sexo”, atividades que geralmente são vistas como preliminares, como estimulação manual e oral, deixam de ser apenas precursores de outra coisa. Passam a ser o evento principal, explica Kerner.
Dito isso, existem mulheres que conseguem ter orgasmo durante a relação sexual, esclarece Debby Herbenick, professora da Escola de Saúde Pública da Universidade de Indiana e autora de "Yes, Your Kid: What Parents Need to Know About Today’s Teens and Sex" ("Sim, seu filho: o que os pais precisam saber sobre adolescência e sexo de hoje"), cuja pesquisa sugere que 18% das mulheres têm orgasmo apenas com penetração.
— Para as mulheres que querem ter orgasmo durante a penetração vaginal ou a relação sexual, tudo bem querer isso. E existem maneiras de tentar — acrescenta.
Homens não são interruptores de luz
Existem muitos clichês sobre a sexualidade masculina: entre eles, que todos os homens pensam em sexo constantemente e que “basta uma brisa forte para que um homem tenha uma ereção”, diz Kerner.
— O que se perde é a verdade maior de que a sexualidade masculina é tão complexa e variável quanto a feminina — afirma Kerner.
A discrepância de desejo é a questão número 1 que ele vê em sua prática, e os homens são tão propensos a serem o parceiro de baixo desejo quanto as mulheres, revela. Muitas vezes, seus clientes masculinos sentem muita vergonha e constrangimento por não estarem iniciando sexo da maneira que “deveriam”.
— Homens não são interruptores de luz quando se trata de sexo —acrescenta Kerner. — Eles não simplesmente ligam e desligam.
A intimidade deve estar no calendário, não apenas o sexo
Colocar o sexo no calendário é um conselho muito comum em terapia sexual, mas Tanner acredita que pode ter o efeito contrário.
— A pressão de ter que manter um compromisso sexual pode, na verdade, diminuir o desejo sexual — explica. — Em vez de colocar o sexo no seu calendário, agende uma atividade que abra a porta para a intimidade.
O que isso significa varia de casal para casal, afirma Jessa Zimmerman, terapeuta sexual em Seattle, que oferece o mesmo conselho aos seus clientes. Talvez seja uma noite de encontro.
Talvez vocês queiram deitar na cama um pouco mais cedo do que o habitual e ver o que acontece.
— É muito diferente de "Ok, vamos fazer sexo todas as noites de domingo". Não demora muito para que a pessoa de menor desejo comece a evitar ou temer isso — explica.
É possível encanar demais com bom sexo
Sara Nasserzadeh, psicóloga social e autora de "Love by design" ("Amor intencional"), que trabalha com clientes ao redor do mundo, diz ver uma tendência entre alguns de seus clientes norte-americanos de sentir que precisam falar sobre sexo à exaustão.
— É ridículo para mim, porque o sexo é algo que envolve os corpos — define. — Envolve o somático.
Isso não significa que seu lema seja “Apenas faça”, mas às vezes você precisa deixar seus corpos se conectarem e “falarem” por você, afirma Nasserzadeh.
Em outras palavras: o sexo deve momentaneamente roubar sua inteligência, sugere Stephen Snyder, terapeuta sexual baseado na cidade de Nova York e autor de "Love worth making" ("Amor que vale a pena fazer"). Deve torná-lo um pouco egoísta e talvez até fazer você regredir um pouco, acrescenta.
— Bom sexo te deixa mais burro — afirma, rindo. — E sexo ótimo te deixa realmente, realmente estúpido.
Fonte: O Globo
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