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Entenda por que adultos estão sofrendo AVC cada vez mais cedo



Manuela teve um acidente vascular cerebral (AVC) aos 30 anos. Após 15 dias de internação, repensou seus objetivos de vida. No caso de Pedro Myguel, o episódio ocorreu aos 27 anos, cerca de um mês depois de ele decidir dar um tempo do trabalho que o consumia. Bruno também tinha 27 anos quando ficou com o corpo paralisado após voltar da academia, e o bailarino Paulo sofreu um AVC após passar por um término de relacionamento traumático.


O AVC, também conhecido como derrame cerebral, é uma emergência de saúde grave e pode levar à morte ou a incapacitações. Caracterizado por entupimentos ou rompimentos dos vasos sanguíneos que alimentam o cérebro, é mais comum em pessoas com mais de 60 anos, que já acumulam problemas de saúde.

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No entanto, de uns tempos para cá, os casos vêm aumentando entre os jovens — segundo os especialistas, a mudança brusca no perfil do paciente que sofre o acidente é causada, principalmente, pelo estilo de vida.

“Quase 80% dos AVCs acontecem depois dos 60 anos de idade. Mas a frequência de casos entre pessoas mais jovens realmente tem aumentado. Dados brasileiros, da cidade de Joinville (SC) – que faz um mapeamento muito completo dos pacientes com AVC – confirmam esse aumento”, afirma a médica Gisele Sampaio, neurologista e pesquisadora do Hospital Israelita Albert Einstein.

Fatores de risco

Todos os anos, 15 milhões de pessoas no mundo sofrem um AVC. Destas, 5 milhões ficam permanentemente com sequelas incapacitantes, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Existem dois tipos de AVC. O isquêmico, que acontece quando o fluxo de sangue e oxigênio é interrompido, causando danos ao tecido cerebral; e o hemorrágico, que ocorre quando o sangue escapa de um vaso para dentro ou redor do cérebro.

A Organização Mundial do AVC estima que o número de mortes por derrame cerebral poderá aumentar 47% no mundo até 2050. Elas podem saltar de 6,6 milhões em 2020 para 9,7 milhões no meio do século se ações de monitoramento e prevenção não forem aprimoradas.

Os fatores de risco mais comuns que levam a um AVC incluem hipertensão, diabetes, colesterol alto, distúrbios e problemas cardíacos. Embora sejam condições mais comuns depois dos 50 anos, elas também podem ser diagnosticadas em jovens adultos, adolescentes e até mesmo crianças.

“Esses fatores de risco precisam de tempo no organismo para fazer estrago nas artérias e veias. Nos indivíduos que são mais jovens, outras causas de AVC passam a chamar atenção”, considera o médico Rodrigo Silveira, neurologista do Hospital Icaraí, em Niterói.

Além disso, existem causas para o AVC raras e menos conhecidas, que são mais prevalentes entre os jovens, como problemas de coagulação, tendência familiar a formar mais trombos, e a dissecção arterial (um pequeno trauma na artéria que pode levar à formação de coágulos). Entre as mulheres, o risco aumenta no puerpério, com uma alteração hormonal que favorece a formação dos trombos.

“São situações raras, mas que na população mais jovem aparecem como causas frequentes de acidentes de vascular cerebral”, afirma Gisele, pesquisadora do Einstein.

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O estresse como causador do AVC

Estudos já mostraram apontaram o estresse como um fator de risco importante para o AVC. Acredita-se que ele seja um facilitador para a instalação de outros fatores de risco, como o sedentarismo e o tabagismo.

“A gente imagina que o indivíduo que é estressado faça menos exercício, cuide menos da sua alimentação, talvez seja uma pessoa que não consiga ir ao médico para avaliar os fatores de risco tratáveis, como hipertensão e diabetes”, considera a neurologista.

Foi o que aconteceu com o carioca Pedro Myguel. Aos 28 anos, ele levava uma vida agitada, e acabou pedindo demissão do trabalho por se sentir sobrecarregado. Dias depois, em março de 2023, ele sofreu um AVC.

Embora não se lembre de muita coisa do momento em que sofreu o derrame, Pedro recorda que sentiu mal-estar ao acordar e teve dificuldade de caminhar pelo apartamento. Os sintomas seguiram por cinco dias, até que um colega percebeu a fala enrolada do jovem ao telefone. Foi o sinal para chamar ajuda.

“Eu achava que era invencível, mas o AVC me mostrou que sou humano. Posso ser frágil e posso pedir ajuda”, considera.

O derrame atingiu o lado esquerdo do cérebro do rapaz, comprometendo momentaneamente o movimento do lado direito de seu corpo. O braço dele ficou recolhido, com a mão na altura do coração.

Um ano depois, com a ajuda de fisioterapia, Pedro já tem uma rotina normal. Mas desde então, o carioca, que se orgulhava de ter uma caligrafia bonita, evita pegar em um lápis por medo de não conseguir escrever sequer o próprio nome.

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Uma situação semelhante aconteceu com a brasiliense Manuela Barcelos, 37 anos. Ela sofreu um AVC isquêmico em 2017. Na época, era confeiteira e levava uma rotina agitada e estressante. “Basicamente só ia para casa pra tomar banho, comer e dormir”, conta em entrevista ao Metrópoles.

No dia anterior ao episódio, Manuela sentiu uma dor de cabeça intensa, mas tentou ignorar o problema e seguiu trabalhando. No momento do AVC, ela sentiu a boca ficar torta, junto com uma fraqueza no corpo. Foi aí que a jovem percebeu que havia algo errado e procurou ajuda médica.

O derrame deixou a confeiteira com todo o lado esquerdo do corpo paralisado, sem movimentos no braço e na perna. Manuela passou um mês e meio internada. Durante esse período, ela recebeu o diagnóstico de lúpus e de síndrome antifosfolípide, condições que favorecem a formação de coágulos na corrente sanguínea.

As limitações causadas pelas sequelas do AVC fizeram Manuela ser aposentada por invalidez. “Infelizmente, precisei parar de trabalhar. Eu exercia uma profissão que exige autonomia e movimentos precisos. Também tive de adiar meus planos pessoais. Planejava viajar pelo mundo e fazer alguns cursos de gastronomia no exterior”, lamenta.

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AVC por coração partido

Indivíduos saudáveis, sem nenhum tipo de fator de risco, também podem sofrer o AVC. O bailarino Paulo Meyer Júnior, 37, por exemplo, tem excelente condição física e era coreógrafo, ciclista e jogador de voleibol quando teve o derrame. Ele tinha 27 anos.

Sem causas físicas que justificassem o rompimento da veia no cérebro de Paulo, ele e os médicos acreditam que o AVC aconteceu por um motivo específico: o fim de um relacionamento conturbado que deixou o bailarino depressivo e ansioso.

“Eu me alimentava bem, dava aulas de dança o dia todo, mas com o término, me fechei e fiquei sofrendo sozinho. Pouco depois, em uma manhã de segunda, não consegui levantar para dar minhas aulas. Comecei a sentir dores de cabeça como se fossem pontadas”, lembra.

Paulo achou que as dores eram causadas pelas crises de choro e que estava com enxaqueca. Mas o incômodo só piorou, mesmo com remédios. Três dias depois, ele procurou um pronto-socorro e um teste no consultório médico seguido de um exame de imagem confirmou o AVC.

Foi necessário fazer uma cirurgia com crânio aberto para retirar o excesso de sangue do cérebro — Paulo ficou acordado durante o procedimento e respondeu perguntas para que os médicos tivessem certeza que ele estava bem. O bailarino ficou 11 dias na UTI e se recuperou plenamente. Em 2024, comemora os 10 anos do derrame. “Sinto que renasci”, comenta.

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Reação alérgica também pode desencadear problema

Em um caso menos comum, o paulistano Bruno Rodrigues sofreu um AVC em março deste ano, aos 27 anos, depois de comer uma castanha. O analista de atendimento voltava da academia com a esposa quando comeu a semente e sofreu uma grave crise alérgica que causou o derrame.

Bruno, que não sabia ter alergia a castanha, passou 27 dias internado em uma unidade de terapia intensiva (UTI). Quando acordou, não falava e não tinha nenhum movimento no corpo e nem nos olhos. Ele retomou gradativamente a consciência e voltou a falar de forma lenta.

Casos de derrame após crises alérgicas são extremamente raros, mas podem acontecer quando a reação é muito grave e o paciente sofre uma parada cardiorrespiratória.

“Pode faltar sangue no cérebro e isso vai levar a uma hipóxia cerebral, um consequente AVC, e o paciente pode ir a óbito”, explica o neurocirurgião Victor Hugo Espíndola, que atende em Brasília.


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