'E se eu jogar meu celular pela janela?': O que são pensamentos intrusivos e o que fazer quando aparecem

Você pode estar em uma aula de ioga quando, do nada, se imagina levantando e dando um grito em meio ao ambiente silencioso. Pode estar em um lugar alto e, de repente, imaginar: 'e se eu jogar meu celular lá embaixo?'. Se você já pensou algo parecido, saiba que não está sozinho. Esse fenômeno - pensar coisas malucas ou inapropriadas repentinamente - é comum e conhecido como pensamento intrusivo.

O assunto ganhou as redes sociais nos últimos tempos e dezenas de vídeos com relatos do tipo passaram a pipocar na internet. Mas como funcionam os pensamentos intrusivos? Com que frequência eles podem acontecer? E o que fazer quando for difícil resistir a eles? É o que você entende na reportagem a seguir.

Com bom humor, a psicóloga Gabriela Muciacito chama a atenção para o assunto, explicando como funciona esse fenômeno para os seus mais de 87 mil seguidores no TikTok. Uma das postagens sobre pensamentos intrusivos chegou a 8 milhões de visualizações.

"Lendo os comentários vejo o quanto falar sobre isso é importante e traz alívio às pessoas. É muito gratificante e reconfortante ver temas da saúde mental ganhando espaço e visibilidade. Falar sobre mente, comportamento e psicologia ainda é visto como tabu. As pessoas mostram dificuldade e resistência em falar sobre alguns pensamentos que possuem, quando, na maioria das vezes, esse tipo de pensamento é comum, e quase todas as pessoas têm", diz Gabriela .

O psiquiatra Álvaro Cabral Araújo, que atua no Amban, ambulatório que trata transtornos de ansiedade no Instituto de Psiquiatria da USP, também falou com o g1 sobre o assunto. Ele explica que os pensamentos intrusivos são experimentados pela maioria das pessoas e, habitualmente, não comprometem a atividade que a pessoa está executando naquele momento, além de não produziremsofrimento significativo.

💭O que são pensamentos intrusivos?

Álvaro explica que eles são classificados como pensamentos que ocorrem de forma espontânea, sem que a pessoa tenha pensado racionalmente sobre aquilo. Muitas vezes os pensamentos intrusivos entram em conflito com os próprios valores ou com aquilo que a pessoa entende que deseja conscientemente.

Gabriela complementa, e diz que os pensamentos intrusivos podem estar ligados às regras morais, de segurança, pensamentos religiosos, de cunho sexual, pensamentos agressivos e negativos, de modo que a pessoa sinta vergonha ou culpa por ter esse tipo de pensamento, mesmo não estando no seu controle.

🤔Eles podem comandar as nossas ações?

Na maioria das vezes, os pensamentos intrusivos não vão comandar nossas ações. Na maior parte do tempo, eles vão ir e vir na nossa mente sem causar nenhum dano.

De forma geral, dizemos que os pensamentos são parte do comportamento do indivíduo. Não existe uma relação diretamente causal entre pensamento e ação, diz Álvaro. É pouco comum que pessoas obedeçam a esses pensamentos, pois na hora que chegam, eles geralmente conflitam com os valores morais e crenças da pessoa, fazendo com que ela reprima o comportamento que está sendo sugerido pelo pensamento.

Se a pessoa obedece aos pensamentos e se coloca, ou coloca o outro em uma situação de risco ou de constrangimento, explica Gabriela, a situação passa a ser vista como um potencial problema de saúde mental.

❌ Eles significam algo como uma falha de caráter, por exemplo?

Os pensamentos intrusivos não tem relação com o caráter, mas com preocupações, possíveis danos, riscos, e crenças disfuncionais. Estar conversando com alguém e de repente ter um pensamento intrusivo como “E se eu jogasse esse copo de água na cara dessa pessoa?” é comum, e não quer dizer que você realmente faria isso, ou que é uma pessoa ruim por pensar isso. Quer dizer apenas que um pensamento surgiu, de forma automática, e ele conflitou com uma regra moral sua. Pensamentos são só pensamentos, não representam a verdade, explica Gabriela.

🌪️Esse fenômeno está relacionado à ansiedade?

O psiquiatra comenta que os pensamentos intrusivos podem se apresentar de forma patológica, produzindo sofrimento em pacientes que têm de transtornos psiquiátricos, como transtorno obsessivo compulsivo (TOC), transtorno de estresse pós-traumático, transtornos de ansiedade e depressão, entre outros. Aí, a recomendação é procurar uma ajuda médica. Cada caso precisa ser avaliado individualmente.

🗣️ Como se livrar desses pensamentos? Existe tratamento?

Gabriela dá uma dica: uma boa estratégia para lidar com pensamentos intrusivos é focar no aqui e no agora, o que chamamos de mindfulness, inclusive com a prática de meditação. Foque no momento presente com mais atenção, e quando seu pensamento divagar, deixe ele ir e voltar para o presente.

Uma pessoa que tem pensamentos intrusivos vez ou outra, pode facilmente aprender a lidar com eles, sem necessidade de tratamento, explica a psicóloga.

Fonte: G1