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Criança também sofre de depressão

Benício tem 9 anos e nesse ano começou a apresentar mudanças de comportamento na escola. Tem se sentido cansado para fazer qualquer tipo de atividade, está mais irritado e na hora do intervalo procura ficar sozinho, evitando as brincadeiras que antes o atraíam. Quando questionado se está tudo bem, ele responde que ninguém gosta dele ou que não está com vontade de brincar. Os professores percebem que ele está mais distraído em sala e que está sonolento. Quando chamam sua atenção, ele diz que não tem conseguido dormir durante a noite e que tem tido muitos pesadelos. Suas notas na escola pioraram e ele começou a brigar com seus colegas de turma, mostrando-se mais agressivo e intolerante. Após ser encaminhado para avaliação, Benício foi diagnosticado com depressão e está fazendo psicoterapia. Embora muitos adultos se perguntem e até mesmo duvidem que crianças possam ficar deprimidas, a depressão também pode ocorrer na infância. O que muda é que a expressão dos sintomas se manifesta de forma diferente, dependendo da idade.

A depressão, embora seja um transtorno comum, é menos frequente nessa fase da vida, com prevalência de 1% a 2% e atingindo meninos e meninas na mesma proporção. Esse transtorno de humor é multifatorial, sendo a genética uma das principais causas, por isso se os pais da criança já apresentaram depressão, os riscos de que ela ou ele também manifestem o transtorno são maiores. Além da genética, padrões de raciocínio – tais como o negativismo ou criticismo excessivo – e o contexto familiar conturbado, são fatores que podem aumentar as chances de uma criança desenvolver o quadro (Estanislau & Bressan, 2014).

Segundo a Associação Americana de Ansiedade e Depressão (ADAA), a depressão na infância pode se manifestar de forma um pouco diferente do que em adultos, sendo que a irritabilidade e/ou a raiva são os sinais mais comuns. As crianças mais novas, quando deprimidas, comumente apresentam sintomas físicos ou corporais como dores, desconfortos e inquietações.

Além do que foi citado acima, outros sinais de depressão em crianças são:

– Perda de interesse em atividades habituais divertidas

– Dificuldades de concentração

– Aumento do sono (ou diminuição)

– Alterações de apetite e de peso

– Demonstração de falta de energia

– Cansaço excessivo

– Fala ou desenhos sobre temas relacionados à morte e/ou despedidas

– Comentários que indicam desesperança ou baixa autoestima

– Piora no rendimento escolar

– Dificuldade para tomar decisões

– Vontade de desaparecer ou de fugir

Nem todos os sintomas mencionados devem estar presentes para o diagnóstico de depressão na infância. Tais sintomas geralmente ocorrem na maioria dos dias por, pelo menos, duas semanas, a fim de atender aos critérios de depressão. Caso os sintomas acima sejam notados na escola, procure o coordenador educacional para que a família possa ser acionada e a criança possa passar por uma avaliação médica e psicológica.

O tema de depressão na infância tem sido amplamente estudado. Segundo pesquisa do Dr. Marcelo Zappitelli, publicada pela Universidade Federal de São Paulo, cerca de 40% a 70% das crianças com depressão apresentam também transtornos de ansiedade e transtornos disruptivos, tais como transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno de oposição desafiante (TOD) e transtorno de conduta (TC). Já uma pesquisa publicada pelo Jornal da USP, indica que transtornos mentais em adultos começam na infância em 75% dos casos e que a falta de tratamento pode ter consequências no desenvolvimento escolar, na futura carreira e nas habilidades sociais. A pesquisa aponta também que 80% dos estudantes com algum transtorno mental não recebem nenhum tratamento médico ou psicológico.

Dados como esses reforçam a importância de se reconhecer os primeiros sinais de depressão, para que assim a criança possa ser encaminhada e receba cuidados com a saúde emocional desde cedo. Além disso, somada à crença de que crianças não sofrem de depressão, está o estigma das questões de saúde mental como um tabu. É na escola que podem se tornar ainda mais visíveis os principais sintomas de depressão, já que diversas alterações de comportamento podem apontar para o início do transtorno na infância. É nessa fase da vida que a criança desenvolve diversas habilidades sociais, que começa a exercitar o autocontrole, a capacidade de resolver problemas e a estruturar as suas formas de pensamento que podem impactar todo o seu desenvolvimento futuro.

Ana Carolina C D’Agostini é psicóloga e pedagoga com formação pela PUC-SP, especialização em psicologia pela Universidade Federal de São Paulo e mestre em Psicologia da Educação pela Columbia University. Trabalha com projetos em competências socioemocionais e é consultora do projeto de Saúde Emocional da Nova Escola.

Fonte: Novaescola.org

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