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Como gerenciar sua solidão? Sentir-se só equivale a fumar 15 cigarros por dia no risco de morte



Todo mundo se sente solitário de vez em quando – depois, digamos, de uma mudança para uma nova escola ou cidade, quando um filho vai para a faculdade ou após a perda do cônjuge. Algumas pessoas, porém, experimentam a solidão não apenas transitoriamente, mas cronicamente.


Torna-se “um traço de personalidade, algo bastante pegajoso”, diz a médica Ellen Lee, professora associada de psiquiatria da Universidade da Califórnia, em San Diego, nos EUA. Esses indivíduos parecem ter “essa emoção persistente que molda seu comportamento”.


Aumentam as pesquisas de que esse tipo de solidão arraigada é prejudicial à saúde e pode até alterar nossos cérebros, aumentando o risco de doenças neurodegenerativas. Aqui está o que os especialistas sabem sobre como a solidão crônica afeta o cérebro e algumas estratégias para lidar com isso.


Como a solidão muda o cérebro?


Os humanos evoluíram para serem criaturas sociais provavelmente porque, para os nossos antepassados, estar sozinho poderia ser perigoso e reduziria a probabilidade de sobrevivência.


Os especialistas acreditam que a solidão pode ter surgido como um tipo único de sinal de estresse que nos leva a buscar companhia. Na solidão crônica, essa resposta ao estresse fica estagnada e torna-se desvantajosa – semelhante à forma como a ansiedade pode mudar uma resposta útil ao medo para uma doença mental.


— Pequenos e transitórios episódios de solidão realmente motivam as pessoas a procurar conexões sociais — diz Anna Finley, pesquisadora de pós-doutorado no Instituto sobre Envelhecimento da Universidade de Wisconsin-Madison.


Mas segundo ela, "em episódios crônicos de solidão, o tiro parece sair pela culatra”, porque as pessoas ficam especialmente sintonizadas com ameaças sociais ou sinais de exclusão, o que pode tornar assustador ou desagradável interagir com outras pessoas.


A pesquisa mostrou que pessoas solitárias são hipersensíveis a palavras sociais negativas, como “não gostei” ou “rejeitado”, e a rostos que expressam emoções negativas. Além disso, mostram uma resposta atenuada a imagens de estranhos em situações sociais agradáveis, sugerindo que mesmo encontros positivos podem ser menos gratificantes para eles. No cérebro, a solidão crônica está associada a mudanças em áreas importantes para a cognição social, autoconsciência e processamento de emoções.


Como poderia um sentimento subjetivo ter um efeito tão profundo na estrutura e nas funções do cérebro? Os cientistas não têm a certeza, mas acreditam que quando a solidão desencadeia a resposta ao estresse, também ativa o sistema imunológico, aumentando os níveis de algumas substâncias químicas inflamatórias. Quando são vivenciados por longos períodos de tempo, o estresse e a inflamação podem ser prejudiciais à saúde do cérebro, danificando os neurônios e as conexões entre eles.


Como a solidão afeta a saúde do cérebro a longo prazo?


Durante anos, os cientistas souberam da associação entre a solidão e a doença de Alzheimer e outros tipos de demência. Um estudo publicado no final do ano passado sugeriu que a solidão também está associada à doença de Parkinson.


— Mesmo níveis baixos de solidão aumentam o risco, e níveis mais elevados estão associados a um risco mais elevado (de demência) — diz a médica Nancy Donovan, diretora da divisão de psiquiatria geriátrica do Brigham and Women’s Hospital.


Donovan demonstrou que as pessoas com pontuações mais elevadas numa medida de solidão têm níveis mais elevados das proteínas amiloide e tau – duas características da doença de Alzheimer – nos seus cérebros, mesmo antes de mostrarem sinais de declínio cognitivo.


Os cientistas acreditam que o estresse e a inflamação causados ​​pela solidão muito provavelmente contribuem para o aparecimento ou aceleração de doenças neurodegenerativas em idosos. O impacto que a solidão exerce sobre o sistema cardiovascular, aumentando a pressão arterial e a frequência cardíaca, também pode ter um efeito prejudicial no cérebro e provavelmente também desempenha um papel, segundo Donovan.


A forma mais geral como a solidão afeta a saúde física e mental também pode influenciar o declínio cognitivo. O sentimento está intimamente ligado à depressão, outra condição que aumenta o risco de demência. E as pessoas que estão sozinhas têm menos probabilidade de serem fisicamente ativas e mais propensas a fumar cigarros.


— Todas essas coisas diferentes podem afetar o envelhecimento do nosso cérebro — pontua Lee. — Acho que há muitos caminhos para passar da solidão ao declínio cognitivo.


A maioria das pesquisas sobre solidão e neurodegeneração foi realizada em adultos de meia-idade e mais velhos, por isso os especialistas não sabem se a solidão na infância ou na idade adulta jovem acarreta o mesmo risco. No entanto, a médica Wendy Qiu, professora de psiquiatria e farmacologia experimental e terapêutica na Escola de Medicina da Universidade de Boston, descobriu que se as pessoas na meia-idade se sentem sozinhas apenas transitoriamente, e não cronicamente, não há risco aumentado de demência.


Com a solidão transitória, o cérebro tem a “capacidade de se recuperar”, afirma Qiu. Mas se as pessoas “não tiverem ajuda para tirá-las da solidão e por muito tempo se sentirem sozinhas, isso será tóxico para o cérebro”.


Como você pode combater a solidão crônica?


Uma das recomendações mais comuns é um pouco óbvia: tente fazer novos amigos. Quer seja através de aulas de arte, equipes desportivas, grupos de apoio ou oportunidades de voluntariado, o objetivo é colocar-se em locais onde as pessoas se reúnem.


Esses tipos de situações sociais planejadas têm resultados mistos. Segundo Lee, eles tendem a funcionar melhor se houver uma “identidade compartilhada” entre as pessoas envolvidas, como grupos específicos para viúvas ou para pessoas com diabetes, para que tenham algo com que se conectar.


O outro lado da equação é abordar as atitudes e padrões de pensamento de uma pessoa sobre as interações sociais por meio da terapia cognitivo-comportamental. Essas abordagens tendem a ser um pouco mais eficazes, de acordo com Lee, porque “chegam à raiz” do problema, explorando o que torna difícil para uma pessoa interagir com outras pessoas.


As estratégias podem parecer simples, mas são mais fáceis de falar do que fazer.

— É um problema espinhoso — avalia Finley. — Caso contrário, não creio que teríamos o relatório do Cirurgião Geral dizendo que precisamos resolver isso.


Fonte: O Globo

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