Janyne Luna, de 32 anos, sequer estava acima do peso ideal para sua altura e idade quando decidiu usar um medicamento para emagrecer no começo de 2019.
O suplemento manipulado era à base de plantas, e por isso, ela não imaginou que poderia causar algum mal. "Queria dar uma secada rápida, só para ficar bem no vestido de madrinha de casamento que eu usaria em breve", conta ela, que trabalha como servidora pública e é atleta amadora de basquete. Ela conseguiu uma receita através de uma amiga e decidiu testar as cápsulas que prometiam ter efeitos rápidos. Depois de usar por 20 dias, sem notar resultados, resolveu parar com a medicação. Um mês depois, começou a sentir enjoos, seu corpo e olhos ficaram amarelados, ela teve tremor nas mãos, confusão mental, e sua urina escureceu, sintomas de uma inflamação no fígado que, mais tarde, descobriria que foi causada pelo suplemento. Sem histórico de doenças, Janyne ficou surpresa com o diagnóstico. "Senti culpa, ainda mais por saber eu nem precisava daquilo. Foi a única vez que inventei de tomar remédio para emagrecer e sofri consequências graves", diz à BBC News Brasil. Segundo o hepatologista Huygens Garcia, chefe do Serviço de Transplante de Fígado do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), da Universidade Federal do Ceará, onde Janyne foi atendida, ela teve uma falência hepática aguda, também conhecida como hepatite fulminante. O único tratamento possível, explica ele, era um transplante de urgência.
Janyne conta como recebeu a notícia: "O impacto foi muito grande, tanto para mim quanto para a minha família. Eu nunca havia passado por uma internação ou cirurgia na vida. Ficamos muito apreensivos, já que nunca se sabe o dia que vai chegar o órgão novo e se vai dar tempo de transplantar. A 'sorte' é que essa espera não demorou muito e em cinco dias depois que eu entrei na lista, meu fígado novo chegou". Em junho de 2019, ela recebeu o novo fígado que salvou sua vida.
O hepatologista alerta que diversos medicamentos podem prejudicar diretamente as células do fígado, principalmente os que possuem substâncias com alta capacidade tóxica para o órgão e que sejam usados de forma prolongada e em altas doses, causando a hepatite medicamentosa.
"Quero reforçar que essa é uma condição rara e que algumas das pessoas são mais suscetíveis", afirma.
No entanto, por não saber como cada organismo reagirá, o ideal é nunca começar um tratamento por conta própria.
Huygens aponta que, para o bem-estar do fígado e do corpo de maneira geral, é necessária uma alimentação adequada e atividades físicas, mas principalmente do cuidado na ingestão de substâncias como álcool e medicamentos. Os perigos da automedicação Independentemente de serem sintéticos (produzido por meio de reações químicas) ou fitoterápicos (substâncias de origem vegetal), todos os medicamentos – e isso inclui até mesmo uso de plantas medicinais (como os chás) – devem ser consumidos com orientação médica e farmacêutica.
De acordo com a farmacêutica Francisca Miranda Lustosa, chefe do Setor de Farmácia Hospitalar do HUWC, em uma consulta, são analisados o contexto e histórico de sintomas do paciente, com atenção e prescrição de forma individualizada.
"A automedicação desconsidera essa opinião especializada e coloca em risco a saúde a curto, médio ou longo prazo, principalmente com impactos mais frequentes nos rins e fígado."
É necessário estar alerta para não considerar que algo não fará mal só por parecer natural. Há produtos que se dizem à base de plantas, mas que não passam por um rigor na sua fabricação.
Todo medicamento ou suplemento precisa ser registrado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgão regulador da qualidade, e, para isso, testes de segurança são feitos. Mas há, ainda, aqueles que são vendidos sem aprovação ou que podem causar mal a determinadas pessoas por características individuais do organismo. Depois do que passou, Janyne conta que fez questão de alertar ao máximo de amigos. "Não existe fórmula milagrosa para emagrecimento. As substâncias ditas naturais não são inofensivas à saúde. Não é porque uma pessoa tomou e não sentiu nada, que vai acontecer o mesmo com você. Não se automediquem. Você não sabe o que pode estar fazendo com o seu corpo", disse a atleta. A vida pós-transplante Janyne recebeu alta nove dias depois do transplante e foi sendo acompanhada pela equipe médica com uma periodicidade cada vez menos curta: uma vez por semana, depois a cada 15 dias, a cada mês e, atualmente, já passa por consultas trimestralmente, além de tomar medicamento para evitar a rejeição do novo órgão a cada 12 horas. "Estou satisfeita com minha aparência e cicatriz. A preocupação com o peso é somente por questão de saúde, preciso controlar minha alimentação e peso por causa das medicações que eu tomo para evitar a rejeição." O caso de Janyne também reforça a importância da doação de órgãos: "Eu tive a sorte de conseguir um órgão compatível a tempo, mas não é todo mundo que consegue, infelizmente", disse.
Para ser um doador, qualquer pessoa a partir dos 18 anos, em boas condições de saúde, pode se cadastrar na Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecidos (Adote).
Além desse cadastro, é fundamental que os parentes sejam comunicados sobre o desejo para que, após a morte, os familiares autorizem a retirada dos órgãos. Há também a possibilidade de doação em vida de rim (por ser um órgão duplo), fígado e pulmão (partes destes órgãos podem ser doados) e de medula óssea.
Fonte: G1
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